Por Márcia
Fabiana Lemes Póvoa Bou-Karim* e Uberth Domingos Cordeiro**
A utilização da
expressão "mero
aborrecimento ou dissabor cotidiano"
é exaustivamente repetida em atos normativos decisórios atinentes
ao Direito do Consumidor. Diversas sentenças, decisões monocráticas
e acórdãos prolatados pelos diversos órgãos do Poder Judiciário,
afastam a reparação civil por danos morais fulcradas na expressão
citada acima, e que faz parte do título de nossa explanação.
Aliás, não se
pode descurar que referida interpretação enobrece o descaso, e
encoraja a atitude destemida de maus fornecedores de produtos e
serviços no mercado de consumo. A
priori,
não há que se falar em indústria do dano moral, e sim há que se
falar em indústria de maus fornecedores de empresas de prestações
de serviço que a cada dia subestimam a parte hipossuficiente na
relação de consumo, ou seja: o consumidor.
No que consiste o
mero aborrecimento ou mero dissabor cotidiano exaustivamente
utilizados na fundamentação jurídica denegatória do dano moral?
Como é facilmente constatado, a interpretação da expressão "mero
aborrecimento ou dissabor cotidiano"
é eivada de elementos subjetivos e de valores e costumes. “Com
efeito, de ordens diversas se conjugam as pessoas na vida social,
mantendo-se inúmeros de seus laços à luz das figuras básicas da
teoria das fontes, que assim se mostra presente em todos os campos do
Direito Civil.”
(BITTAR,
Carlos Alberto. Direito
dos Contratos e dos Atos Unilaterais –
1ª ed. – Rio de Janeiro-RJ: Forense Universitária, 1990. p. 06.)
O entendimento
jurisprudencial pátrio consolidado posiciona-se que "mero
aborrecimento ou dissabor cotidiano"
é um fato contumaz e imperceptível que não atinge a esfera
jurídica personalíssima do indivíduo, sendo um fato da vida, não
repercutindo no nada altera o aspecto psicológico ou emocional de
alguém.
E não sobeja
nenhum tipo de dúvida que a indenização deve primeiramente, levar
em conta a conduta e situação da vítima e do réu, isto é, a dor
física e moral da vítima, a repercussão do fato vexatório e
danoso, a condição financeira das partes envolvidas, o grau de
culpa do réu, a inversão do ônus da prova e etc. E
principalmente, o efeito educativo, ou “corregedor” da decisão,
desestimulando entendimentos iguais ou em entendimentos assemelhados
em erros futuros.
Considerando
o perfil econômico do querelante - consumidor e do querelado -
fornecedor, a gravidade e efeitos da repercussão da notícia danosa,
bem como a contextualização dos fatos no momento em que ocorreram
e, cabalmente comprovada à ocorrência do dano moral e o dever da
Requerida em ressarcir o Requerente em uma demanda judicial. “O
CDC, que possui vida própria, autônoma e compatível ao vigente
sistema constitucional, passou por pequenas alterações desde seu
surgimento, motivadas por novas leis como o Código Civil em 2002.
Apesar de o CDC ser uma lei forte, exibe ainda deficiências nas
relações de consumo com empresas aéreas, operadoras de planos de
saúde, administradoras de cartões de crédito, imobiliárias,
construtoras, provedores, instituições financeiras, telefonias fixa
e móvel, comércio eletrônico. Também falta eficácia nas
necessárias garantias pelos fabricantes, somadas ao número escasso
de representantes técnicos destes.”
(MARQUES,
André. Dia
do consumidor.
Disponível in
Acesso 24/03/2013. )
De
acordo com os princípios da proporcionalidade e da defesa do
Consumidor é que irá ajudar a mensurar a discussão do dano Moral
nas relações de consumo. Pelo fato de demonstrar um grande problema
da reparação civil de forma justa e proporcional sem gerar
enriquecimento ilícito é que esta discussão tem ganhado espaço
admirável entre os operadores do direito e dos grandes e ilustres
doutrinadores.
Essa
discussão será de bom cunho, pois essas decisões são muito
Subjetivas e para facilitar sua objetividade na apuração do Dano
Moral entrará no caráter punitivo pedagógico.
Para
Objetivar mais ainda as decisões tem-se que levar em conta a
situação econômica o bem e o serviço prestado ao consumidor esses
critérios dá-se uma maior objetividade evitando também o
enriquecimento sem causa.
Há
ainda os que falam em defesa da indústria do dano moral da livre
concorrência elencado no artigo 170 da Constituição Federal, tido
como um manifestação da liberdade de iniciativa, esquecem assim que
na própria Carta Magna estabelece também os limites para esta
atuação reprimindo assim o abuso do poder econômico em seu artigo
173, § 4º CF.
Vale
salientar que quando o Estado for aplicar a norma constitucional
prevista no artigo 170, incisos V e VI e o artigo 5º, XXXII e X da
Constituição Federal, não deverá esquecer nunca de utilizar o
principio da eficiência.
Não
esquecendo ainda o principio do acesso à justiça, e a garantia dos
direitos Subjetivos, é a garantia das garantias constitucionais,
onde encontra-se a independência dos juízes como também a do juiz
natural bem como o direito de ação e da defesa. Isso garante a
efetividade da defesa do consumidor que no plano material depende da
possibilidade de efetivo acesso ao Poder Judiciário para a devida
obtenção da Tutela Jurisdicional do Estado de forma adequada e
tempestiva.
Conforme
dito alhures para qualificar o dano Moral sofrido deve-se atender aos
importantes elementos citados levando sempre em consideração que os
danos morais são lesões sofridas por pessoas físicas, na maioria
das vezes, em aspectos da personalidade, através de atos ilícitos
que automaticamente causa-lhes dores, mágoas, constrangimentos,
vexames e muitas outras sensações negativas.
Data
máxima vênia os aplicadores do direito devem sem sombra de dúvida
verificar a culpabilidade do causador do dano, os antecedentes, a
adequação social, os motivos bem como a extensão do dano e as
circunstâncias e o caráter punitivo pedagógico do dano moral em
sua dosimetria.
Denota-se
aqui e fica claro e evidente que a Súmula 385 do STJ que fala que
caso o consumidor já tenha anotação de seu nome dos órgãos de
proteção ao crédito não configura o dano moral, ora como que não
se configura um dano moral se o ato ilícito não se torna lícito
quando preexistente legítima inscrição, logicamente continua o ato
ilícita sem sombra de dúvidas.
Nessa
ótica verifica-se que a Súmula 385 do STJ, não encontra de forma
alguma correspondência ao que enunciado nos artigos 186, 187, 188 e
927 do Código Civil, nem mesmo no artigo 42, § 2º do Código de
Defesa do Consumidor.
Primeiramente
toda anotação irregular que é a ação ou omissão voluntária,
por negligência ou por imprudência viola direito e causa dano a
outrem, constituindo assim o ato ilícito artigo 186 Código Civil.
Segundo
temos que toda anotação irregular constitui abuso de direito, uma
vez que esse ato negligente artigo 187 Código Civil, viola aqui os
bons costumes e a boa-fé.
Terceiro
temos que por ser irregular o apontamento restrito de crédito, nem
há de se falar em exercício irregular de um direito reconhecido
artigo 188, I do Código Civil, ficando assim claro a violação do
artigo 42 § 2º do Código de Direito do Consumidor, deixando claro
mais uma vez e demonstrado com uma fundamentação incisiva de que o
simples fato do consumidor já ter seu nome incluso nos órgãos de
proteção ao crédito não tira o seu direito de indenização por
dano moral caso seja ilicitamente incluso por outrem.
Definitivo
e mais que notório em relação ao aspecto da acepção educadora
dos danos morais, a lição sempre autorizada de Caio Mário da Silva
Pereira que corrobora toda essa nossa argumentação:
“Quando se cuida
do dano moral, o fulcro do conceito ressarcitório acha-se deslocado
para a convergência de duas forças “caráter punitivo” para que
o causador do dano, pelo fato da condenação, se veja castigado pela
ofensa que praticou e o “caráter compensatório” para a vítima,
que receberá uma soma que lhe proporcione prazeres como
contrapartida do mal sofrido”. (Responsabilidade Civil, p. 55 e 60,
itens nº 45 e 49, 8ª ed., 1996, Forense.)
Na realidade, o
que se verifica, tendo em tela a importância dos estudos sobre dano
moral, é que o consumidor continua sendo martirizado por meio de uma
interpretação estapafúrdia e equivocada do texto legal, ferindo o
espírito e a própria vontade do legislador ao normatizar as
relações de consumo.
*Márcia
Fabiana Lemes Póvoa Bou-Karim - Advogada,
sócio do escritório PÓVOA
E PÓVOA ADVOGADOS ASSOCIADOS
- Membro da Comissão de Direito do Consumidor da Seccional OAB/GO.
**Uberth
Domingos Cordeiro - Advogado,
sócio do escritório PEDRO
CORDEIRO DA SILVA E ADVOGADOS ASSOCIADOS
- Membro da Comissão de Direito do Consumidor da Seccional OAB/GO.