Nayron Divino Toledo Malheiros
INTRODUÇÃO
A fim de ter adimplidas as obrigações tributárias ou não o Estado através de suas Fazendas Públicas criou diversos mecanismos fiscais para cobrar seus créditos, neste sentido podemos exemplificar a criação da Dívida Ativa com todos os seus reflexos, e posteriormente a execução fiscal a qual é um procedimento judicial com várias peculiaridades.
Mesmo com todas estas vantagens, verificou-se a dificuldade de se resgatar créditos inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais) que somam ao final grande monta, mas geram altos custos para sua execução fiscal.
Como forma de alterar esta realidade o Procurador Geral da Fazenda Nacional instituiu uma portaria na qual tais débitos poderiam ser protestados cartorariamente.
Tal medida tem gerado grande discussão, tanto doutrinária quanto judicial.
1 O INSTITUTO DA DÍVIDA ATIVA
1.1 Conceito de Dívida Ativa e sua previsão legal
Dívida ativa nada mais é do que o crédito que o Estado possui com terceiros e que foi constituído por intermédio de sua Fazenda Pública, sendo que estes créditos poderão ser cobrados por intermédio de uma ação de execução fiscal. O Código Tributário Nacional em seu artigo 201 traz a seguinte definição:
Art. 201. Constitui dívida ativa tributária a proveniente de crédito dessa natureza, regularmente inscrita na repartição administrativa competente, depois de esgotado o prazo fixado, para pagamento, pela lei ou por decisão final proferida em processo regular.
A Lei de Execuções Fiscais, lei 6.830/80 traz em seu texto um definição mais abrangente sobre este assunto, incluindo ali os créditos de natureza tributária e os de ordem não tributária, conforme veremos abaixo:
Art. 2º - Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública aquela definida como tributária ou não tributária na Lei nº 4.320, de 17 de março de 1964, com as alterações posteriores, que estatui normas gerais de direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal.
§ 1º - Qualquer valor, cuja cobrança seja atribuída por lei às entidades de que trata o artigo 1º, será considerado Dívida Ativa da Fazenda Pública.
§ 2º - A Dívida Ativa da Fazenda Pública, compreendendo a tributária e a não tributária, abrange atualização monetária, juros e multa de mora e demais encargos previstos em lei ou contrato.
Já a lei 4.320/64 nos traz a diferenciação entre Dívida Ativa Tributária e Não Tributária, vejamos:
Artigo 39
(...)
§ 2º - Dívida Ativa Tributária é o crédito da Fazenda Pública dessa natureza, proveniente de obrigação legal relativa a tributos e respectivos adicionais e multas, e Dívida Ativa não Tributária são os demais créditos da Fazenda Pública, tais como os provenientes de empréstimos compulsórios, contribuições estabelecidas em lei, multa de qualquer origem ou natureza, exceto as tributárias, foros, laudêmios, alugueis ou taxas de ocupação, custas processuais, preços de serviços prestados por estabelecimentos públicos, indenizações, reposições, restituições, alcances dos responsáveis definitivamente julgados, bem assim os créditos decorrentes de obrigações em moeda estrangeira, de subrogação de hipoteca, fiança, aval ou outra garantia, de contratos em geral ou de outras obrigações legais.
Observamos aqui que o legislador tentou ser bastante claro ao estabelecer os conceitos e diferenciações entre estes institutos que fazem parte do cotidiano dos operadores de Direito Tributário.
1.2 Constituição da Certidão de Dívida Ativa (CDA)
Diante do que foi exposto nos textos legais supramencionados, depreendemos que após procedimento administrativo de constituição do crédito tributário, se este crédito não for quitado dentro do prazo predeterminado pela lei ou se não existir nenhum recurso com efeito suspensivo (administrativo ou judicial) deverá o mesmo ser inscrito para que somente assim se torne exequível.
Tal inscrição deverá seguir os requisitos exarados no artigo 202 do CTN, sendo que com a devida inscrição poderá se extrair a certidão de dívida ativa (CDA), a qual é um título executivo extrajudicial, conforme disposição do artigo 585, VII, do Código de Processo Civil, a qual é utilizada nas ações de execução fiscal.
2 O INSTITUTO DO PROTESTO NO DIREITO PÁTRIO
2.1 Histórico
O instituto do protesto teve sua origem no direito brasileiro pelo Alvará de 19/10/1789, sendo que em 1850 o Código Comercial (Lei número 556/1850) regulamentou esta matéria em seu Título XVI (artigos 354 a 427).
Já no ano de 1908 o Decreto número 2.044 revogou os dispositivos do Código Comercial que tratavam deste tema, e os regulamentando novamente em seus artigos 29 ao 33.
Em 1966 entrou em vigor o Decreto 57.663 o qual promulgou a Lei Uniforme de Genebra que tratou do tema no que fazia referência as Letras de Câmbio e Notas Promissórias.
O protesto de Duplicatas foi disposto pelos artigos 13 e 14 da Lei 5.474/68, já o Cheque teve essa matéria regulamentada em seus artigos 47 e 48 da Lei 7.357/85.
Somente em 10 de setembro de 1997 foi publicada a lei 9.492 a qual regulamenta sobre os serviços concernentes ao protesto de títulos e outros documentos de dívida e dá outras providências.
2.2 Conceito
A palavra protesto possui sua origem etimológica do latim protestor, que significa declarar em alto e bom som.
Nos ensinamentos de Maria Helena Diniz temos a seguinte definição:
Declaração pública feita pelo proprietário ou portador de título, dentro de prazo regulamentar, perante o notário, alegando o fato de que o devedor de um título cambial (letra de câmbio, duplicada, nota promissória, cheque) se recusa a aceitá-lo ou a paga-lo no vencimento, para que se autentique a veracidade do inadimplemento obrigacional pela pessoa que devia cumprir a obrigação.[1]
Tal entendimento é reafirmado pelo artigo 1º da lei de protestos,vejamos:
Art. 1º. Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida
Com base nestes conceitos apresentados, chegamos a conclusão que o protesto se traduz em uma declaração formal feita pelo credor com a função precípua de cientificá-lo do inadimplemento ou do simples descumprimento de alguma obrigação contraria sua vontade decorrente daqueles títulos.
A necessidade de tal protesto se faz pois diante do Direito Privado, pode existir sempre a possibilidade de acordo entre as partes no sentido de adiar o vencimento desta obrigação, diante disso e estritamente importante esta declaração.
2.3 Efeitos do Protesto
O protesto é o instrumento utilizado para a proteção e conservação dos interesses dos credores diante dos atos e fatos jurídicos firmados na relação Credor X Devedor, e gera os seguintes efeitos:
· Torna público o título;
· Interrompe a prescrição;
· Atesta a inexecução da obrigação cambial;
· Obsta a mora do credor e comprova que diligenciou a cobrança de título;
· Pode impedir, conforme o caso, a concordata preventiva;
· Prova impontualidade;
· Constitui o devedor em mora;
· Serve como critério de fixação do termo legal da falência;
· Preservar o direito de regresso contra coobrigados.
3 A PORTARIA 321/2006 DO PROCURADOR GERAL DA FAZENDA NACIONAL
Em 6 de abril de 2006 o Procurador Geral da Fazenda Nacional, por intermédio de uma portaria, criou a hipótese de se levar a protesto as Certidões de Dívida Ativa da União que não ultrapassassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais), antes mesmo do ajuizamento de uma ação de execução fiscal.
Tal procedimento segundo o Procurador estaria respaldado pelos art. 1º da Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997 e o art. 585, inciso VI, do Código de Processo Civil.
Os defensores da efetiva aplicação desta portaria se baseiam nas premissas de que tal protesto corresponde a um exercício regular de direito, cuja suas finalidades primordiais são de tornar público a mora do devedor tributário por intermédio do reconhecimento extrajudicial do débito.
Afirmam ainda que o protesto seja benéfico ao contribuinte devedor, haja vista que o mesmo terá a oportunidade de quitar seu débito antes que seja proposta uma ação de execução fiscal evitando assim a condenação nos ônus da sucumbência, nem em uma possível constrição de bens patrimoniais.
No senso comum é sabido que tais execuções fiscais de valor abaixo de R$ 10.000,00 (dez mil reais) não são viáveis a serem ajuizadas pelo poder público, tendo em vista que seu custo operacional é maior do que até mesmo o próprio crédito exigido, correndo o perigo da execução ainda não lograr êxito.
Desta forma, o protesto seria o meio mais ágil de forçar o devedor a quitar a suas obrigações tributárias face aos inúmeros reflexos de ordem prática (inclusão do nome do devedor no Serasa, não concessão de empréstimos, restrição ao crédito no mercado de consumo).
4 O ABUSO DE DIREITO NO PROTESTO DE CERTIDÕES DE DÍVIDA ATIVA
O protesto de Certidão de Dívida Ativa deve ser considerado como um verdadeiro abuso de direito das Fazendas Públicas, face a sua total desnecessidade para que seja proposta uma ação de execução fiscal.
Tal procedimento está maculado por inúmeros vícios, configurando assim com meio coativo utilizado pela Fazenda Pública que no intuito de ter seu crédito adimplindo, criando situações constrangedoras. A CDA não é título cambial apto a ser levado a protesto.
4.1. O abuso aos princípios constitucionais
O Constituinte prevendo as possibilidades de abusos pelo Poder Público, foi muito cuidadoso ao dispor na Carta Magna de 1988 vários princípios balisadores das atividades públicas, dentre eles temos o Princípio da Legalidade, no qual para a Administração Pública só é dado fazer o que a lei expressamente determina, não ficando a vontade do administrador agir fora dos limites legais. Neste sentido temos os brilhantes ensinamentos de Hely Lopes Meireles:
Na administração Publica não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é licito fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Publica só é permitido fazer o que a lei autoriza.
(...) a natureza da função publica e a finalidade do Estado impedem que seus agentes deixem de exercitar os poderes e de cumprir os deveres que a lei lhes impõe.[2]
Desta feita, o Poder Público, ao agir, deve apenas se pautar segundo o interesse público determinado na própria lei, obedecendo sempre a finalidade de seus institutos. Assim, não pode a Administração, ao seu “bem interesse” agir fora dos ditames impostos pela norma com a justificativa de proteção de interesses.
Considerando-se que a CDA por si só já constitui como sendo prova o inadimplemento e o descumprimento de obrigação documental (artigo 204, CTN); e que a finalidade legal do protesto é exatamente a mesma, resta evidente a ausência de interesse jurídico da Administração Fazendária em levar a CDA a protesto.
Quando a Administração Pública leva a protesto uma CDA, fica devidamente comprovado que age como um meio de coagir a Requerente a fim de receber o crédito descrito no documento, haja vista que atualmente um dos bens infungíveis mais importante tanto para as pessoas físicas e jurídicas é possuir seu crédito no mercado.
4.2 A coação feita aos contribuintes
Tal protesto gera inúmeros constrangimentos e problemas para aqueles contribuintes protestados, haja vista que tais informações são encaminhadas imediatamente aos bancos de dados como SERASA, EQUIFAX, desencadeando assim na morte ao crédito daquele inadimplente, o qual não terá se quer condições de contratar um simples linha telefônica em seu nome pelo fato do CDA protestada.
Os abusos cometidos pelas Fazendas Públicas são sempre repreendidos pelos tribunais, neste sentido podemos reafirmar que tal portaria ao criar esta coação, poderá ser dada como será igualada ao entendimento já sedimentado por via de súmulas do Supremo Tribunal Federal
Súmula 70 - É inadmissível a interdição de estabelecimento como meio coercitivo para cobrança de tributo.
Súmula 323 - É inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de tributos.
Súmula 547 - Não é lícito à autoridade proibir que o contribuinte em débito Adquira estampilhas, despache mercadorias nas alfândegas e Exerça suas atividades profissionais.
Observamos aqui claramente que o STF considera abusiva qualquer atividade, ou método coercitivo utilizado pela Fazenda no intuito de buscar o adimplemento de créditos tributários.
4.3 O desvio de finalidade
A lei do protesto foi editada com o único objetivo de provar a inadimplência do devedor, neste sentido se manifestou Fábio Ulhoa, in verbis:
o protesto deve-se definir como ato praticado pelo credor, perante o competente cartório, para fins de incorporar ao título de crédito a prova de fato relevante para as relações cambiais.[3]
Dessa forma, a sua utilização para outra finalidade configura evidente desvio da vontade da lei, isto é, desvio de finalidade.
Se esse desvio é lícito aos particulares, porquanto não proibido, não o é para a Administração Fazendária, sendo conclusivas as seguintes palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, ipsis litteris:
o princípio da finalidade não é decorrência do princípio da legalidade. É mais que isto: é uma inerência dele; está nele contido, pois corresponde à aplicação da lei tal qual é; ou seja, na conformidade de sua razão de ser, do objetivo em vista do qual foi editada. Por isso se pode dizer que tomar uma lei como suporte para a prática de ato desconforme com a sua finalidade não é aplicar a lei; é desvirtuá-la; é burlar a lei sob o pretexto de cumpri-la. Daí por que os atos incursos neste vício - denominado 'desvio de poder' ou 'desvio de finalidade' - são nulos. Quem desatende ao fim legal desatende à própria lei. [4]
Sobre o desvio de finalidade, são expressivas as seguintes palavras de Suzy Elizabeth Cavalcante Koury:
todo instituto jurídico corre o risco de ter sua função desviada, ou seja, utilizada contrariamente às suas finalidades. Esse desvio de função consiste na falta de correspondência entre o fim perseguido pelas partes e o conteúdo que, segundo o ordenamento jurídico, é próprio da forma utilizada.[5]
O próprio sistema jurídico positivo traz os meios pelos quais um crédito do Estado pode ser cobrado, qual seja: a execução fiscal, isto é, a execução de uma dívida inscrita em uma CDA. Burlar essa forma específica e expressa de cobrança, desvirtuando a finalidade do protesto, configura evidente desvio de finalidade.
4.4 Da jurisprudência Pátria
Tal prática ilegal tem sido rechaçada pelos Tribunais de Justiça do país, senão vejamos em recentíssimos julgados:
APELAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROTESTO DE CDA SEM LEI QUE O AUTORIZE. Ilegalidade: O administrador público, segundo o princípio da estrita legalidade, somente pode fazer o que a Lei permite e, não havendo previsão legal para o protesto da CDA, este se revela inaceitável. Apelação provida. (TJSP; APL-Rev 869.774.5/7; Ac. 3981191; Guarulhos; Décima Oitava Câmara de Direito Público; Rel. Des. J. Martins; Julg. 25/06/2009; DJESP 31/08/2009)
APELAÇÃO CÍVEL. CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO . APELAÇÃO 1: protesto de cda. Impossibilidade. Recurso provido mesmo improcedente a ação principal, procede a pretensão cautelar de ver sustado em definitivo o protesto de cda, pois caso em contrário resultaria no desvio de finalidade do instituto do protesto, que passaria a exercer função claramente de coação e arbitrariedade, o que não pode ser admitido em face do princípio da moralidade administrativa. Apelo (TJPR; ApCiv 0514596-0; Londrina; Primeira Câmara Cível; Rel. Des. Rubens Oliveira Fontoura; DJPR 15/06/2009; Pág. 152)
APELAÇÃO CÍVEL. CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO DE CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. SENTENÇA QUE, ACERTADAMENTE, DETERMINOU O CANCELAMENTO DEFINITIVO. CDA QUE GOZA DE PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ. IMPERTINÊNCIA DO PROTESTO PARA COMPROVAÇÃO DO INADIMPLEMENTO. MEDIDA DESNECESSÁRIA PARA PROPOSITURA DA AÇÃO EXECUTIVA FISCAL. INAPLICABILIDADE DOS INSTITUTOS DE DIREITO PRIVADO. LEI Nº 9.492/97. NÃO ALCANÇE AOS TÍTULOS DA DÍVIDA PÚBLICA. PROTESTO INDEVIDO E ABUSIVO. MEDIDA DE COAÇÃO PARA PRONTO PAGAMENTO, SEM POSSIBILITAR A DEFESA DO CONTRIBUINTE RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Por possuir presunção de certeza e liquidez, a inscrição regular pressupõe a inadimplência do contribuinte, sendo prova suficiente do não cumprimento da obrigação tributária, o que dispensa qualquer outra providência da Fazenda Pública para exercitar seu direito de cobrança através do meio legal adequado. O ente credor dispõe de prerrogativas e procedimentos próprios para poder cobrar seus créditos tributários, que é a Lei de execução fiscal nº 6.830/80. 2. Eventual agilidade na obtenção dos créditos nãobasta para legitimar o aponte para Protesto de títulos da dívida pública porque, além de não haver interesse jurídico e nem expressa previsão na legislação específica, não se pode subtrair do contribuinte um direito assegurado constitucionalmente, que é a ampla defesa. (TJPR; ApCiv 0358144-0; Londrina; Terceira Câmara Cível; Rel. Juiz Conv. Espedito Reis do Amaral; DJPR 18/01/2008; Pág. 9)
"REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA - PROTESTO - MEIO COERCITIVO DESNECESSÁRIO E INJUSTIFICADO DE COBRANÇA - SENTENÇA RATIFICADA - A certidão de dívida ativa não é título cambial, e o seu apontamento a protesto constitui meio coercitivo para forçar o contribuinte ao pagamento do imposto, por ser desnecessário e injustificado. (TJMT - RNSen 8538/2003 - 1ª C.Cív. - Rel. Des. Rubens de Oliveira Santos Filho - J. 09.06.2003)”
TRIBUTÁRIO E COMERCIAL. CRÉDITO TRIBUTÁRIO. PROTESTO PRÉVIO. DESNECESSIDADE. PRESUNÇÃO DE CERTEZA E LIQUIDEZ. ART. 204 DO CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL. FAZENDA PÚBLICA. AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO PARA REQUERER A FALÊNCIA DO COMERCIANTE CONTRIBUINTE. MEIO PRÓPRIO PARA COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. LEI DE EXECUÇÕES FISCAIS. IMPOSSIBILIDADE DE SUBMISSÃO DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO AO REGIME DE CONCURSO UNIVERSAL PRÓPRIO DA FALÊNCIA. ARTS. 186 E 187 DO CTN.
I - A Certidão de Dívida Ativa, a teor do que dispõe o art. 204 do CTN, goza de presunção de certeza e liquidez que somente pode ser afastada mediante apresentação de prova em contrário.
II - A presunção legal que reveste o título emitido unilateralmente pela Administração Tributária serve tão somente para aparelhar o processo executivo fiscal, consoante estatui o art. 38 da Lei 6.830⁄80. (Lei de Execuções Fiscais)
III - Dentro desse contexto, revela-se desnecessário o protesto prévio do título emitido pela Fazenda Pública.
IV - Afigura-se impróprio o requerimento de falência do contribuinte comerciante pela Fazenda Pública, na medida em que esta dispõe de instrumento específico para cobrança do crédito tributário.
V - Ademais, revela-se ilógico o pedido de quebra, seguido de sua decretação, para logo após informar-se ao Juízo que o crédito tributário não se submete ao concurso falimentar, consoante dicção do art. 187 do CTN.
VI - O pedido de falência não pode servir de instrumento de coação moral para satisfação de crédito tributário. A referida coação resta configurada na medida em que o art. 11, § 2º, do Decreto-Lei 7.661⁄45 permite o depósito elisivo da falência.
VII - Recurso especial improvido. RESPNº 287.824 - MG
CONCLUSÃO
Anote-se, por fim, que a Fazenda Pública tem diversas prerrogativas materiais e processuais na busca da satisfação do seu crédito. Caso perceba que existem fundados receios de não receber o que lhe é devido, poderá inclusive propor medida cautelar fiscal, como meio legal de assegurar o futuro recebimento do seu crédito.
Se a Fazenda Pública não se vale dessas prerrogativas processuais, buscando a satisfação do seu crédito pelo protesto, como meio coercitivo indireto e ilegal de cobrança da CDA, desvirtua as finalidades do instituto, agindo em evidente abuso de poder.
Portanto, na medida em que a Administração Pública deve observar os estritos termos da lei, além de lhe faltar interesse para levar uma CDA ao protesto, ao fazê-lo nitidamente desvia a finalidade legal do instituto e, por esta razão, sua conduta deve ser revista ou rechaçada pelo Judiciário. Sendo assim está se valendo do protesto como forma de coerção indireta para o pagamento da dívida
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[1] DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Volume 3. São Paulo: Saraiva. 1998, pág. 832.
[2] MEIRELES, Hely Lopes. Curso de Direito Administrativo, 11ª edição, São Paulo: Malheiros, 1999, p. 64. Forense, 1993, pg. 67.
[3] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2004, p. 415
[4] MELLO, Antônio Bandeira Curso de Direito Administrativo, 11ª edição, São Paulo: Malheiros, 1999, p. 64
[5] KOURY, Suzi Elizabeth Cavalcante A desconsideração da personalidade jurídica e os grupos de empresas, 1ª ed., SP: Forense