O estabelecimento comercial deve responder pelos danos de carros parados em seu estacionamento. O entendimento é da 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que condenou um shopping da capital mineira a pagar R$ 3.345,00, referente aos danos materiais, a um cliente, que teve o som do carro roubado dentro do estacionamento.
Os desembargadores entenderam que, como o carro estava sob a guarda do shopping, o estabelecimento deve reparar os danos causados. Para o relator, desembargador Batista de Abreu, é difícil provar, concretamente, o furto de um veículo, sobretudo, de parte dele. “Inviável pretender que o usuário do estacionamento faça uma vistoria, com a participação do gestor do estacionamento, toda vez que estacionar e retirar o veículo do estacionamento”, afirmou.
Mas, segundo o desembargador, o cliente juntou documentos que comprovam o furto, como boletim de ocorrência, entradas do cinema, recibo do uso do estacionamento, além de depoimentos de testemunhas.
"Ora, é claro que não se pode decidir o caso para que, a longo prazo, exista um estímulo a demandas ou condenações infundadas. Mas, não se pode admitir a mera negativa da ocorrência do fato como excludente da responsabilidade, especialmente quando possível prova em contrário", afirmou.
De acordo com o relator, o shopping tinha condições de produzir prova, ou pelo menos indícios, de que o furto não aconteceu, através da exibição de circuito interno de vigilância, depoimento testemunhal dos seguranças em serviço naquela noite, entre outros. Mas não o fez.
O cliente foi ao cinema, dentro do shopping. Após a sessão, quando voltou ao estacionamento, verificou que o som de seu carro havia sido furtado. Imediatamente, procurou os funcionários do estabelecimento. Eles garantiram que o shopping iria pagar pelo prejuízo. Em seguida, o cliente foi a uma delegacia e registrou um boletim de ocorrência.
O shopping não pagou e o cliente entrou com uma ação, pedindo indenização por danos materiais e morais. O cliente argumentou que o shopping mantém um estacionamento pago, privativo para seus clientes e, assim, pelo contrato de depósito, seria obrigado a arcar com o prejuízo. Alegou, ainda, que era apaixonado pelo o som e que precisou de muitos anos de economia para comprar um equipamento de primeira qualidade, pois participa de competições de som automotivo.
O shopping alegou que o cliente não tinha legitimidade para entrar com a ação, pois não comprovou ser o dono do veículo e não provou o furto. Além disso, segundo o shopping, o consumidor não poderia fazer o boletim de ocorrência fora do local e sim levar a autoridade policial ao estacionamento.
Em primeira instância, os pedidos foram negados. A Câmara reformou a sentença quanto aos danos materiais, mas manteve a decisão em relação à indenização por danos morais. "O dano moral não decorre de simples aborrecimento da vida cotidiana, mas de uma lesão a bem fundamental. Não há, no furto de um equipamento de som, lesão moral indenizável", concluiu o relator.
Leia a decisão

APELAÇÃO CÍVEL 1.0024.06.008465-4/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): VINÍCIUS JESUS DE PAULA - APELADO(A)(S): CONDOMÍNIO SHOPPING NORTE - RELATOR: EXMO. SR. DES. BATISTA DE ABREU
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM DAR PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO.
Belo Horizonte, 30 de maio de 2007.
DES. BATISTA DE ABREU - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
O SR. DES. BATISTA DE ABREU:
VOTO
Vinícius Jesus de Paula propôs ação indenizatória em face de Condomínio Shopping Norte ao fundamento de que estacionou o automóvel de sua propriedade descrito na inicial no estacionamento do réu, que é privativo de sua clientela; que após ir ao cinema, voltou ao estacionamento e verificou que o som do veículo havia sido roubado; que comunicou o fato imediatamente a funcionários do requerido, que prontamente lhe informaram que arcariam com o prejuízo; que foi até o Plantão Policial, para comunicar o ocorrido; que o autor, apaixonado por som, economizou anos para comprar o som roubado e seus respectivos acessórios; que a culpa in vigilando da requerida; que o referido furto causou aborrecimento, tristeza e angústia; pretende seja o réu condenado a pagar o autor indenização por danos morais no importe de R$20.000,00 (vinte mil reais), e indenização por danos materiais no valor do som furtado, qual seja R$3.345,00 (três mil trezentos e quarenta e cinco reais).
O réu contestou suscitando preliminar de ilegitimidade ativa, porque o autor não juntou aos autos qualquer documento que comprove a propriedade do veículo; que o legítimo detentor do direito de ressarcimento é o proprietário do bem.
No mérito, alegou, em síntese, que seria impossível que um furto desta natureza passasse despercebido pela sua equipe de segurança ou seus clientes, tendo em vista que o volume e quantidade dos equipamentos, assim como sua forma de instalação, exigiriam tempo e trabalho para ser retirados; que despidas de prova as alegações do autor, eis que os documentos de fls. 04 e 09-10 nada comprovam; que o boletim de ocorrência de fls. 10 foi formalizado com base em fatos narrados segundo a versão unilateral e exclusiva do autor; que o autor não juntou sequer o ticket de estacionamento; que o estacionamento não é gratuito, ocorrendo dispensa de pagamento quando há consumo em determinadas lojas; que não houve relato de qualquer arrombamento ou dano do seu veículo, o que seria indispensável para o sucesso do furto; que a nota fiscal apresentada não tem credibilidade, pelo que necessária a intimação da empresa "Audio Control Som e Acessórios Ltda. - ME" para que esta apresente cópia do balanço comercial; que o réu não comprovou qualquer ofensa á sua intimidade, honra ou imagem. Na eventualidade, alega que a indenização deve ser fixada em importe menor do que o valor pleiteado; que os tribunais têm insistentemente reduzido o valo de indenizações por danos morais arbitradas em excesso (fls. 21-35).
A sentença de fls. 58-62, ao fundamento de que os fatos alegados pelo autor não foram devidamente comprovados; que com base nas provas produzidas, a versão do requerido goza de maior credibilidade; que o autor deveria ter solicitado a presença de autoridade competente no momento em que constatou o fato, isto é, antes de retirá-lo das dependências da requerida, contudo, optou por levá-lo à delegacia; que, por outro lado, só se concede a indenização por danos morais quando comprovado violação à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem, ainda que existente o ato ilícito, o que não ocorreu nos autos; julgou improcedente o pedido.
Nas razões da apelação o recorrente alega que o CDC assegura ao consumidor "a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor no processo civil"; que fez ocorrência policial, e também comprovou os fatos alegados por depoimento testemunhal; que o furto do som trouxe aborrecimento, angústia e tristeza, pois participava de competições de som automotivo, sendo que o valor do som igualava o valor do veículo, pelo que deve ser indenizado pelos danos morais e materiais; que não obstante ser pobre ter juntado declaração de pobreza aos atos, foi condenado ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, fixados em R$1.000,00(mil reais), o que deve ser reformado (fls. 64-69).
Contra-razões nas fls. 74-82.
A questão acerca da responsabilidade da empresa por furto em veículo de cliente em seu estacionamento é pacificada na jurisprudência, sendo inclusive objeto do enunciado n° 130, da Súmula do STJ, verbis:
"Súmula 130 - A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorridos em seu estacionamento. (Segunda Seção, julgado em 29.03.1995, DJ 04.04.1995 p. 8294).
Anote-se, incidentalmente, que a existência do dever de guarda do estabelecimento comercial sobre o veículo independe de remuneração direta do usuário, ou seja, de cobrança específica e individual pelo serviço, mesmo porque o valor da manutenção do serviço é repassado de alguma forma aos consumidores. O dever de guarda do mantenedor do estacionamento existe porque há espaço indicado para tal, inclusive, no presente caso, com controle de entrada e fornecimento de cartão específico para o estacionamento (fls. 08). No mesmo sentido o REsp 4582/SP, da relatoria do Ministro Waldemar Zveiter, em que a Terceira Turma do STJ, em julgamento ocorrido em 16.10.1990 (DJ 19.11.1990 p. 13260), concluiu que:
"Depositado o bem móvel (veículo), ainda que gratuito o estacionamento, se este se danifica ou é furtado, responde o depositário pelos prejuízos causados ao depositante, por ter aquele agido com culpa in vigilando, eis que é obrigado a ter na guarda e conservação da coisa depositada o cuidado e diligência que costuma com o que lhe pertence (art. 1.266, 1a. Parte, do Código Civil). (REsp 4582/SP, Rel. Ministro Waldemar Zveiter, Terceira Turma, julgado em 16.10.1990, DJ 19.11.1990 p. 13260).
No mesmo sentido me manifestei no julgamento da Apelação nº 171.852-7/001, da Comarca de Montes Claros.
No caso, a controvérsia decorre do exame da prova. Entretanto, em que pesem os fundamentos da sentença, o apelo merece parcial provimento.
É que a prova concreta, direta, do furto ocorrido, especialmente de furto de parte de um veículo, é impossível ou muito difícil. Inviável pretender que o usuário do estacionamento faça uma vistoria, com a participação do gestor do estacionamento, toda vez que estacionar e retirar o veículo do estacionamento.
Irrelevante o fato de que o Boletim de Ocorrência Policial, único meio de prova disponível para o apelante, tenha sido feito fora do estacionamento: isto não evidencia fraude, que poderia ter ocorrido antes mesmo de se estacionar o veículo, e realizado o Boletim de Ocorrência dentro do estacionamento.
O fato é que há um Boletim de Ocorrência, lavrado no dia em que o apelante demonstrou que teria usado o estacionamento, inclusive apresentando à autoridade policial o recibo de uso do estacionamento e apresentando no processo as entradas de cinema - motivo de sua ida ao shopping. Neste Boletim de Ocorrência registrou-se o furto do equipamento de som do apelante. Também presente prova testemunhal possível, não tendo sido admitida sua contradita, que afirmou a ocorrência do furto.
Das provas possíveis e ao seu alcance, o apelante fez todas. Não havia outra prova possível. De outro lado, escusa-se o gestor do estacionamento mediante meras negativas da ocorrência do fato. Ora, é claro que não se pode decidir o caso para que, a longo prazo, exista um estímulo a demandas ou condenações infundadas. Mas, não se pode admitir a mera negativa da ocorrência do fato como excludente da responsabilidade, especialmente quando possível prova em contrário. O apelado tinha condições de produzir prova, ou pelo menos indícios, de que o evento não ocorreu, através de exibição de circuito interno de vigilância, depoimento testemunhal dos seguranças em serviço naquela noite, etc. No entanto, não houve no processo produção de qualquer elemento neste sentido.
Com relação ao valor da lesão suportada pelo apelante, foi suficientemente comprovada com a nota fiscal de fl. 09, o valor dos equipamentos descritos no Boletim de Ocorrência Policial (fl. 10v.). Também quanto ao aspecto não houve impugnação eficaz pelo apelado, que não suscitou em momento oportuno o incidente adequado, posto que se limitou a pugnar pela produção da prova testemunhal (fl. 51).
Assim, diverso do que se entendeu no julgado monocrático, está suficientemente comprovada a lesão material, havendo dever do gestor do estacionamento de indenizar o apelante.
Com relação à alegação de que em função do evento "o autor foi atingido em seu âmago, em seu íntimo" (fl. 05), e que teria sofrido dano moral, o apelo não prospera. O dano moral não decorre de simples aborrecimento da vida cotidiana, como o retardo no cumprimento das obrigações, mas de uma lesão a bem fundamental. Não há, no furto de um equipamento de som, lesão moral indenizável.
Assim sendo, dou parcial provimento ao recurso de apelação, reformando a r. sentença para julgar parcialmente procedente o pedido, condenando o réu ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$3.345,00 (três mil, trezentos e quarenta e cinco reais), corrigidos monetariamente e acrescidos de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação; recíproca e integralmente compensados os honorários advocatícios, na forma do art. 21, do CPC.
Custas processuais, inclusive as recursais, pelas partes em igual valor.
Votaram de acordo com o(a) Relator(a) os Desembargador(es): JOSÉ AMANCIO e SEBASTIÃO PEREIRA DE SOUZA.

Revista Consultor Jurídico, 11 de julho de 2007
 
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