O plenário do Senado Federal aprovou nesta terça-feira
(22) o projeto de lei que institui o Marco Civil da Internet, considerado uma
espécie de Constituição para uso da rede no país. O texto, que foi aprovado no
mês passado pela Câmara dos Deputados, não sofreu alteração de conteúdo pelos
senadores e seguirá agora para sanção da presidente da República.
O projeto, que estabelece princípios, garantias,
direitos e deveres para internautas e provedores, tramitou por menos de um mês
no Senado. A pedido do Palácio do Planalto, os senadores aliados barraram as
propostas de alteração sugeridas. Se isso ocorresse, o texto teria que retornar
para análise dos deputados, o que adiaria a aprovação.
O governo tinha pressa em aprovar a matéria devido à
conferência internacional sobre governança na internet, que será realizada em
São Paulo nesta semana. A presidente Dilma Rousseff vai participar do evento
nesta quarta e quer levar o Marco Civil como uma das respostas do seu governo
às denúncias de que autoridades e empresas brasileiras teriam sido espionadas
pela NSA, agência de inteligência dos Estados Unidos.
O projeto, porém, não é recente. Foi enviado em 2011
pelo Executivo à Câmara dos Deputados e só aprovado em 25 de março deste ano
após intensa negociação entre parlamentares e Planalto. A chamada neutralidade
de rede, princípio considerado um dos pilares do projeto, foi aprovada e
passará a vigorar com a sanção da nova lei.
O armazenamento de dados no Brasil, que era
considerado uma prioridade para o governo com objetivo de coibir atos de
espionagem, não foi aprovado. Essa obrigação já havia sido derrubada pelos
deputados para viabilizar a aprovação na Câmara (veja regras abaixo).
No plenário do Senado, a aprovação só foi possível
porque os senadores aprovaram um requerimento de inversão de pauta, o que levou
o projeto ao primeiro item a ser votado nesta noite. Governistas tentaram
acordo com a oposição para dar urgência ao projeto, mas não conseguiram
consenso com PSDB e DEM.
A oposição não foi contrária ao Marco Civil da forma
como está, mas alegou que o Senado poderia "aperfeiçoar" o texto,
segundo afirmou o líder do DEM, José Agripino (RN). "Eu quero só um mês
para desatar alguns nós desse Marco Civil da Internet", apelou.
O líder do PSDB, Aloysio Nunes (SP), disse que os
senadores tem "um papel a cumprir" na elaboração do projeto e
criticou a pressa do governo. "Existe uma disposição do governo de não
aceitar nenhuma emenda, estamos proibidos de fazer emenda e, se fizermos, será
apenas para constar. Essa é uma atitude autoritária da presidente da
República", criticou.
Por outro lado, a ex-ministra da Casa Civil senadora
Gleisi Hoffmann (PT-PR) negou "encaminhamento autoritário". "Há
tão somente uma matéria importantíssima em pauta", rebateu. "Temos um
grande evento acontecendo no Brasil, e é importante que tenhamos uma resposta
concreta para regular a internet", afirmou a petista.
Neutralidade
Aprovada junto no projeto, a neutralidade de rede
pressupõe que os provedores não podem ofertar conexões diferenciadas, por
exemplo, para acesso somente a emails, vídeos ou redes sociais. O texto
estabelece que esse princípio será ainda regulamentado pelo Poder Executivo,
para detalhar como será aplicado e quais serão as exceções.
Isso será feito após consulta à Agência Nacional de
Telecomunicações (Anatel) e o Comitê Gestor da Internet (CGI). As exceções
servirão para garantir prioridade a "serviços de emergência" e a
qualidade de algumas transmissões, como vídeos ao vivo. Assim, a transmissão de
e-mails, por exemplo, pode ter menor prioridade no tráfego de dados em prol de
outros serviços.
Críticos da neutralidade dizem que o princípio
restringe a liberdade dos provedores para oferecer conexões diferenciadas
conforme demandas específicas de clientes e que sua aplicação obrigatória pode
encarecer o serviço para todos indistintamente. A proposta não impede a oferta
de pacotes com velocidade diferenciada.
Retirada de conteúdo
De acordo com o projeto, provedores de conexão à web e
aplicações na internet não serão responsabilizados pelo uso que os internautas
fizerem da rede e por publicações feitas por terceiros.
Atualmente não há regras específicas sobre o caso e as
decisões judiciais variam - alguns juízes punem sites como o Facebook e Google
por páginas ofensivas criadas por usuários, enquanto outros magistrados optam
por penalizar apenas o responsável pelo conteúdo.
De acordo com a nova legislação, as entidades que
oferecem conteúdo e aplicações só serão responsabilizadas por danos gerados por
terceiros se não acatarem ordem judicial exigindo a retirada dessas
publicações. O objetivo da norma, segundo Molon, é fortalecer a liberdade de
expressão na web e acabar com o que chama de "censura privada".
Fim do marketing dirigido
Pelo texto aprovado, as empresas de acesso não poderão
"espiar" o conteúdo das informações trocadas pelos usuários na rede.
Há interesse em fazer isso com fins comerciais, como para publicidade, nos
moldes do que Facebook e Google fazem para enviar anúncios aos seus usuários de
acordo com as mensagens que trocam.
Essas normas não permitirão, por exemplo, a formação
de bases de clientes para marketing dirigido, segundo Molon. Será proibido
monitorar, filtrar, analisar ou fiscalizar o conteúdo dos pacotes, salvo em
hipóteses previstas por lei.
Sigilo e privacidade
O sigilo das comunicações dos usuários da internet não
pode ser violado. Provedores de acesso à internet serão obrigados a guardar os
registros das horas de acesso e do fim da conexão dos usuários pelo prazo de
seis meses, mas isso deve ser feito em ambiente controlado.
A responsabilidade por esse controle não deverá ser
delegada a outras empresas.
Não fica autorizado o registro das páginas e do
conteúdo acessado pelo internauta. A coleta, o uso e o armazenamento de dados
pessoais pelas empresas só poderão ocorrer desde que especificados nos
contratos e caso não sejam vedados pela legislação.
FONTE - G1