Nayron Divino Toledo
Malheiros
Na
última semana foi alardeado por todos os meios de imprensa uma
decisão 2ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho, de relatoria do
Ministro Renato de Lacerda Paiva que negou Recurso do Ministério
Público contra o processo seletivo realizado por uma rede de lojas,
que se utilizava de dados do SPC/SERASA para analisar previamente os
candidatos a emprego.
A
fundamentação do Ministro Paiva neste caso foi a seguinte:
"Se
a administração pública, em praticamente todos os processos
seletivos que realiza, exige dos candidatos, além do conhecimento
técnico de cada área, inúmeros comprovantes de boa conduta e
reputação, não há como vedar ao empregador o acesso a cadastros
públicos como mais um mecanismo de melhor selecionar candidatos às
suas vagas de emprego"
Data
vênia, tal argumento apresentado pelo ministro é extremamente
frágil, conforme veremos abaixo:
a)
Primeiramente, não há de se tentar comparar o que não é
comparável, uma coisa é serviço público e outra é serviço
privado. Um concurso público se difere totalmente de um processo
seletivo de emprego na iniciativa privada. Aquele é regido por
vários princípios constitucionais, como por exemplo a Moralidade e
Eficiência, além da existência um edital publicado previamente
onde se estabelece de forma objetiva os critérios de avaliação. Já
na iniciativa privada o processo de seleção é extremamente
subjetivo, até mesmo nas entidades, e empresas com alto nível de
organização.
b)
Em alguns concursos públicos observamos a exigência de referências
sobre o passado do candidato, sendo este obrigado a apresentar
certidões dos distribuidores cíveis e penais dos Tribunais de
Justiça.
Tal exigência, assim como a investigação sobre a vida pregressa é feita em decorrência do cargo público pelo qual aquele candidato irá exercer, sendo que todas estas são fundamentadas e avalizadas pelos princípios constitucionais norteadores da Administração Pública. Desta forma fica evidente que a referida analogia demonstra-se desproporcional e desarrazoada.
Tal exigência, assim como a investigação sobre a vida pregressa é feita em decorrência do cargo público pelo qual aquele candidato irá exercer, sendo que todas estas são fundamentadas e avalizadas pelos princípios constitucionais norteadores da Administração Pública. Desta forma fica evidente que a referida analogia demonstra-se desproporcional e desarrazoada.
- A consulta de dados dos candidatos no SPC/SERASA esbarra em dois problemas recorrentes de notório conhecimento público:
- Apesar destes bancos de dados e cadastros de consumo deterem em seu poder um vasto acervo de informações de crédito sobre uma grande fatia da população, estes ainda apresentam inúmeras falhas e inconsistência em seus arquivos, sendo considerados verdadeiros “clientes da justiça” diante da enorme quantidade de erros que geram várias ações judiciais em busca de retificação de dados, e ainda reparação pelos danos causados pelas informações falsas.
Os erros mais comuns
são as negativações indevidas por não notificarem devidamente as
pessoas ali inscritas, ou ainda por não excluírem débitos já
prescritos ou aqueles que já foram quitados. Ou seja, esses bancos
de dados e cadastros não são inteiramente confiáveis, podendo
prejudicar várias pessoas que serão excluídas de seleções de
trabalho de forma sumária, injusta e sem o devido direito de defesa.
- O outro equívoco do ministro do TST foi de se esquecer da dimensão sociológica do problema. A decisão que considerou válida tal prática na seleção de funcionários visa proteger uma empresa de contratar uma funcionário de má-índole. Por via transversa, esta decisão determinou que aquele indivíduo que está com um débito inscrito no SPC/SERASA, deve carregar a mácula de ser considerado uma pessoa de má-índole, que deve ser excluída de uma seleção.
Devemos
lembrar que a consulta nos bancos de dados é “fria” e
“objetiva”, ela não interpreta a realidade do devedor, ela não
expressa as razões pelas quais o nome daquele indivíduo foi
negativado e porque ainda está lá.
Independentemente
dos valores devidos ali inscritos, as razões podem ser desde de
descaso do negativado como também em virtude de motivos extremamente
alheios a vontade do indivíduo.
Para
exemplificar esses motivos alheios, iremos citar aquelas mudanças na
vida de uma pessoa que geram vários abalos ao seu crédito, neste
rol temos: a)divórcio; b) nascimento de um novo filho; c) doenças
pessoais ou na família; e) empréstimo de nome para terceiros; f) ou
ainda o mais grave neste caso, o próprio desemprego, sendo que agora
o indivíduo busca uma nova recolocação no mercado de trabalho para
quitar suas dívidas, até mesmo aquelas inscritas no SPC/SERASA, e
que hoje o proíbem de voltar a trabalhar.
Essa situação é tão comum em nossa sociedade que existe até um ramo do direito do consumidor que vem estudar esses casos de endividamento, consignando a eles a devida proteção a fim de garantir a possibilidade de quitar suas dívidas e voltar a ter novamente crédito no mercado de consumo.
Encerro
este artigo esperando sinceramente que tal entendimento judicial seja
devidamente retificado, reconhecendo a ilegalidade deste tipo de
consulta a qual ofende todo o sistema de proteção ao trabalhador.
Nayro Divino Toledo Malheiros -
Advogado, assessor jurídico do TJGO, Membro da BrasilCon, Ex-diretor
jurídico do Procon Goiânia,Ex-secretário Geral da Comissão de
direitos do consumidor da OABGO, Pós graduado em Direito Civil ,
Processual Civil e Tributário.
Elaborado em Fevereiro/2012
Twitter - @nayron