As notas aqui divulgadas foram colhidas nas sessões de julgamento e elaboradas pela Assessoria das Comissões Permanentes de Ministros, não consistindo em repositórios oficiais da jurisprudência deste Tribunal.

Primeira Turma

INVESTIGAÇÃO. OAB. DENÚNCIA ANÔNIMA.

A OAB não pode, sob alegação de averiguar o preenchimento de requisitos para a inscrição de candidato nos seus quadros, realizar processo investigatório lastreado em denúncia anônima que noticiou o cometimento de ato de improbidade administrativa pelo bacharel requerente. Assim, a Turma, por maioria, deu parcial provimento ao recurso. Precedente citado: QO na Sd 166-DF, DJe 3/9/2009. REsp 1.074.302-SC, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 20/4/2010.

LOCAÇÃO. MÃO DE OBRA. PIS. COFINS. IRPJ. CSLL.

A Turma reafirmou que a base de cálculo do PIS e da Cofins, independentemente do regime normativo aplicável (LCs ns. 7/1970 e 70/1991 ou Leis ns. 10.637/2002 e 10.833/2003), abrange os valores recebidos pelas sociedades empresárias prestadoras de serviços de locação de mão de obra temporária (Lei n. 6.019/1974 e Dec. n. 73.841/1974) a título de pagamento de salários e encargos sociais de trabalhadores temporários. Também, firmou que esses valores não podem ser excluídos da base de cálculo do IRPJ e da CSLL. Precedentes citados: REsp 1.141.065-SC, DJe 1º/2/2010, e REsp 1.088.802-RS, DJe 7/12/2009. REsp 1.176.749-PR, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 20/4/2010.

DESISTÊNCIA. AÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

Trata-se de agravo regimental contra a decisão que homologou a renúncia manifestada pela parte, ora agravante, que desistiu do processo a fim de aderir ao Refis e agora se insurge contra a condenação em honorários advocatícios. Para o Min. Relator, a verba honorária é devida nos termos do art. 26 do CPC, visto que a isenção prevista no § 1º, art. 6º, da Lei n. 11.941/2009 só alcança as hipóteses disciplinadas no caput do referido artigo do CPC, ou seja, em casos de desistência da ação judicial para restabelecimento de opção ou reinclusão em outros parcelamentos, conforme decisão já assentada na Corte Especial. Observa que também não cabe falar em dispensa de honorários com base na Lei n. 11.941/2009, em razão da extinção da ação proposta pelo contribuinte contra o Fisco para aderir ao Refis. Precedentes citados: AgRg nos EDcl na DESIS no Ag 1.105.849-SP, DJe 23/11/2009, e AgRg nos EDcl nos EDcl no RE nos EDcl no AgRg no REsp 1.009.559-SP, DJe 8/3/2010. AgRg na DESIS no REsp 1.128.942-RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 20/4/2010.

MC. EFEITO SUSPENSIVO. RESP. EXCEPCIONALIDADE.

Foi proposta ação civil pública (ACP) pelo Ministério Público (MP), objetivando obrigação de fazer consistente na demolição de muros e portarias que circundam loteamento, bem como a demolição de construções realizadas em avenida, pois edificadas em áreas de uso comum do povo. Além disso, buscando a obrigação de não fazer consubstanciada na proibição de erigir novos obstáculos ou adotar medidas restritivas à livre circulação de populares no interior do loteamento. O juiz julgou improcedente o pedido e o TJ julgou procedente a ação coletiva. Antes da execução provisória do julgado, que consistiria na demolição dos muros e portarias, a associação de moradores recorrente, por força da decisão de agravo que determinou a subida do REsp, propôs medida cautelar (MC), visando à concessão de efeito suspensivo ao REsp. Segundo o entendimento sedimentado neste Superior Tribunal, a concessão de efeito suspensivo a REsp é de excepcionalidade absoluta, dependente de instauração da jurisdição cautelar do STJ, viabilidade recursal pelo atendimento de pressupostos recursais específicos e genéricos e não incidência de óbices sumulares e regimentais, bem como plausibilidade da pretensão recursal formulada contra eventual error in judicando ou error in procedendo. A soma desses requisitos consubstancia a aparência do bom direito da requerente da MC originária, que deve estar associada ao perigo na demora que ocasione dano irreparável ou de difícil reparação. Isso posto, presentes os requisitos, a Turma julgou procedente a MC para atribuir efeito suspensivo ao REsp até o julgamento final do recurso. Precedentes citados: AgRg na MC 3.295-SP, DJ 19/2/2001, e AgRg na MC 3.135-DF, DJ 18/12/2000. MC 15.726-SP, Rel. Min. Luiz Fux, julgada em 20/4/2010.

Segunda Turma

QO. REMESSA. PRIMEIRA SEÇÃO. DUPLA GARANTIA. REFIS.

A Turma remeteu o julgamento do especial à Primeira Seção. O recurso cuida da dupla garantia (judicial e administrativa) dada por sociedade empresária que aderiu ao Refis. QO no REsp 1.144.596-RS, Rel. Min. Herman Benjamin, em 20/4/2010.

CRECHE. RESERVA DO POSSÍVEL. TESE ABSTRATA.

A tese da reserva do possível (Der Vorbehalt des Möglichen) assenta-se na idéia romana de que a obrigação impossível não pode ser exigida (impossibilium nulla obligatio est). Por tal motivo, não se considera a insuficiência de recursos orçamentários como mera falácia. Todavia, observa-se que a reserva do possível está vinculada à escassez, que pode ser compreendida como desigualdade. Bens escassos não podem ser usufruídos por todos e, justamente por isso, sua distribuição faz-se mediante regras que pressupõem o direito igual ao bem e a impossibilidade do uso igual e simultâneo. Essa escassez, muitas vezes, é resultado de escolha, de decisão: quando não há recursos suficientes, a decisão do administrador de investir em determinada área implica escassez de outra que não foi contemplada. Por esse motivo, em um primeiro momento, a reserva do possível não pode ser oposta à efetivação dos direitos fundamentais, já que não cabe ao administrador público preteri-la, visto que não é opção do governante, não é resultado de juízo discricionário, nem pode ser encarada como tema que depende unicamente da vontade política. Nem mesmo a vontade da maioria pode tratar tais direitos como secundários. Isso porque a democracia é, além dessa vontade, a realização dos direitos fundamentais. Portanto, aqueles direitos que estão intimamente ligados à dignidade humana não podem ser limitados em razão da escassez, quando ela é fruto das escolhas do administrador. Não é por outra razão que se afirma não ser a reserva do possível oponível à realização do mínimo existencial. Seu conteúdo, que não se resume ao mínimo vital, abrange também as condições socioculturais que assegurem ao indivíduo um mínimo de inserção na vida social. Sendo assim, não fica difícil perceber que, entre os direitos considerados prioritários, encontra-se o direito à educação. No espaço público (no qual todos são, in abstrato, iguais e cuja diferenciação dá-se mais em razão da capacidade para a ação e discurso do que em virtude de atributos biológicos), local em que são travadas as relações comerciais, profissionais e trabalhistas, além de exercida a cidadania, a ausência de educação, de conhecimento, em regra, relega o indivíduo a posições subalternas, torna-o dependente das forças físicas para continuar a sobreviver, ainda assim, em condições precárias. Eis a razão pela qual os arts. 227 da CF/1988 e 4º da Lei n. 8.069/1990 dispõem que a educação deve ser tratada pelo Estado com absoluta prioridade. No mesmo sentido, o art. 54, IV, do ECA prescreve que é dever do Estado assegurar às crianças de zero a seis anos de idade o atendimento em creche e pré-escola. Portanto, na hipótese, o pleito do MP encontra respaldo legal e jurisprudencial. Porém é preciso ressalvar a hipótese de que, mesmo com a alocação dos recursos no atendimento do mínimo existencial, persista a carência orçamentária para atender a todas as demandas. Nesse caso, a escassez não seria fruto da escolha de atividades não prioritárias, mas sim da real insuficiência orçamentária. Em situações limítrofes como essa, não há como o Poder Judiciário imiscuir-se nos planos governamentais, pois eles, dentro do que é possível, estão de acordo com a CF/1988, não havendo omissão injustificável. Todavia, a real insuficiência de recursos deve ser demonstrada pelo Poder Público, não sendo admitido que a tese seja utilizada como uma desculpa genérica para a omissão estatal no campo da efetivação dos direitos fundamentais, principalmente os de cunho social. Dessarte, no caso dos autos, em que não há essa demonstração, impõe-se negar provimento ao especial do município. Precedentes citados do STF: AgRg no RE 410.715-SP, DJ 3/2/2006; do STJ: REsp 1.041.197-MS, DJe 16/9/2009; REsp 764.085-PR, DJe 10/12/2009, e REsp 511.645-SP, DJe 27/8/2009. REsp 1.185.474-SC, Rel. Min. Humberto Martins, julgado em 20/4/2010.

MORTE. DETENTO. INDENIZAÇÃO.

Cuida-se da morte de detento em casa prisional. Nesse contexto, é impossível a acumulação de auxílio-reclusão, convertido em pensão após o óbito do detento, com a indenização por danos materiais fixada a título de pensão à família do de cujus. A indenização por dano material só se refere ao ressarcimento do que representou a diminuição indevida do patrimônio do ofendido. REsp 1.125.195-MT, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/4/2010.

AÇÃO POPULAR. ACORDO. MUNICÍPIO.

O município ajuizou ação ordinária contra o estado-membro e outros, por rebelar-se contra o critério de distribuição da parcela de ICMS referente a uma usina hidroelétrica. Conforme a legislação estadual, o município só fazia jus a 3% dessas receitas, mas ele buscava receber 100%. Sucede que, quanto a isso, houve acordo, homologado judicialmente, em que o município era contemplado com 50% da referida parcela. Então, cidadãos do município ajuizaram a ação popular ao fundamento de que houve renúncia de receita e consequente lesão ao patrimônio público, na qual foi concedida liminar, ao final mantida pelo acórdão recorrido. Nesse contexto, vê-se que o acordo realizado entre os municípios (tal qual termo de ajustamento de conduta) pode, em tese, ser rescindido (art. 486 do CPC), desde que ocorra ofensa ao patrimônio público lato sensu, tangível ou intangível. Assim, a rigor, o objeto da anulação é o ato jurídico subjacente (ajuste entre as partes) e não exatamente a sentença, que é meramente declaratória. Dessarte, no caso, em que o pleito é de anulação de ato lesivo, a ação popular é adequada (art. 5º, LXXIII, da CF/1988), pois essa adequação é aferida pelo pedido formulado, não pelo resultado da demanda. Anote-se que não se cuidou do mérito, visto que, ao cabo, a decisão atacada é apenas liminar. REsp 884.742-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/4/2010.

Terceira Turma

PRINCÍPIO SAISINE. REINTEGRAÇÃO. COMPOSSE.

Cinge-se a questão em saber se o compossuidor que recebe a posse em razão do princípio saisine tem direito à proteção possessória contra outro compossuidor. Inicialmente, esclareceu o Min. Relator que, entre os modos de aquisição de posse, encontra-se o ex lege, visto que, não obstante a caracterização da posse como poder fático sobre a coisa, o ordenamento jurídico reconhece, também, a obtenção desse direito pela ocorrência de fato jurídico – a morte do autor da herança –, em virtude do princípio da saisine, que confere a transmissão da posse, ainda que indireta, aos herdeiros independentemente de qualquer outra circunstância. Desse modo, pelo mencionado princípio, verifica-se a transmissão da posse (seja ela direta ou indireta) aos autores e aos réus da demanda, caracterizando, assim, a titularidade do direito possessório a ambas as partes. No caso, há composse do bem em litígio, motivo pelo qual a posse de qualquer um deles pode ser defendida todas as vezes em que for molestada por estranhos à relação possessória ou, ainda, contra ataques advindos de outros compossuidores. In casu, a posse transmitida é a civil (art. 1.572 do CC/1916), e não a posse natural (art. 485 do CC/1916). Existindo composse sobre o bem litigioso em razão do droit de saisine é direito do compossuidor esbulhado o manejo de ação de reintegração de posse, uma vez que a proteção à posse molestada não exige o efetivo exercício do poder fático – requisito exigido pelo tribunal de origem. O exercício fático da posse não encontra amparo no ordenamento jurídico, pois é indubitável que o herdeiro tem posse (mesmo que indireta) dos bens da herança, independentemente da prática de qualquer outro ato, visto que a transmissão da posse dá-se ope legis, motivo pelo qual lhe assiste o direito à proteção possessória contra eventuais atos de turbação ou esbulho. Isso posto, a Turma deu provimento ao recurso para julgar procedente a ação de reintegração de posse, a fim de restituir aos autores da ação a composse da área recebida por herança. Precedente citado: REsp 136.922-TO, DJ 16/3/1998.REsp 537.363-RS, Rel. Min. Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ-RS), julgado em 20/4/2010.

AQUISIÇÃO. VEÍCULO. ERRO. MODELO.

O autor alega que era um satisfeito proprietário de um automóvel ano 1995, por isso trocou-o por um novo da mesma marca e modelo, ano 2001. Contudo, insatisfeito com a compra, entendeu que o novo veículo não atendeu às suas expectativas. A peculiaridade do caso é que não se reclama por defeito apresentado pelo carro, mas pelo fato de que o consumidor adquiriu um automóvel intermediário, mas, segundo alega, pensava adquirir o modelo mais luxuoso. Assim, discute-se se o prazo de decadência, nessa hipótese, é contado apenas após o término da garantia; se há vício do produto ou do serviço ou fato do produto ou do serviço em decorrência do descumprimento do dever de informação pelo vendedor; e, por fim, se estariam presentes as condições necessárias para a inversão do ônus da prova. Para a Min. Relatora, a contagem do prazo de decadência para a reclamação de vícios do produto (art. 26 do CDC) inicia-se após o encerramento da garantia contratual. A postergação do início da contagem desse prazo, contudo, justifica-se pela possibilidade, contratualmente estabelecida, de que seja sanado o defeito apresentado durante a garantia. Na hipótese em que o consumidor não adquire bem propriamente defeituoso, mas alega ter-se enganado quanto ao objeto adquirido, comprando o automóvel intermediário em vez do mais luxuoso, não há, necessariamente, qualquer defeito a ser corrigido durante o prazo de garantia. No caso, o que houve foi erro do consumidor quanto ao objeto que adquiriu. A decadência para pleitear a devolução da mercadoria, a troca do produto ou o abatimento do preço, portanto, conta-se, sendo aparente a diferença entre os modelos, da data da compra. No tocante à inversão do ônus da prova, ela pressupõe hipossuficiência (técnica, jurídica ou econômica) ou verossimilhança das alegações feitas pelo consumidor. Os costumes comerciais indicam que a parte interessada, na aquisição de um automóvel de luxo, costuma buscar, ao menos, as informações quanto aos modelos existentes. A prática também indica que todos os modelos disponíveis, notadamente os mais caros, são apresentados ao comprador. Não há, portanto, verossimilhança na alegação de que a concessionária omitiu do consumidor a informação sobre o modelo luxuoso. Também não há hipossuficiência do consumidor, uma vez que não é economicamente fraca a parte que adquire automóvel de luxo, e não há desequilíbrio técnico ou jurídico se o comprador adquire o automóvel pelo convênio mantido entre a montadora e uma associação. Isso posto, a Turma negou provimento ao recurso. REsp 1.021.261-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/4/2010.

SA. ASSEMBLÉIA-GERAL.

A recorrente, sociedade empresária industrial, alega que o acórdão recorrido violou os arts. 143, IV, 144, caput e parágrafo único, e 159 da Lei n. 6.404/1976, ao não considerar a existência de legitimidade ativa para a propositura da ação ordinária de indenização por ato ilícito movida contra os recorridos. Afirma que o estatuto da companhia outorga ao diretor-presidente todos os poderes necessários para gerir a empresa e adotar as ações cabíveis na esfera administrativa e judicial na defesa dos seus interesses. Aduz, ainda, que os requeridos não eram administradores da companhia, o que dispensaria a necessidade de prévia autorização da assembléia-geral para a propositura da ação de indenização por ato ilícito. Porém, o Min. Relator destacou que o art. 159 da mencionada lei estabelece, com clareza, em seu caput, a necessidade de prévia autorização da assembléia-geral para que a companhia possa mover ação contra um de seus administradores. O fato de o requerido ter-se, segundo a requerente, indevidamente, intitulado diretor-presidente, quando era somente diretor-tesoureiro, e outorgado procuração para venda de bem da empresa, não retira a necessidade de prévia deliberação da assembléia-geral autorizando a companhia a ingressar com ação contra ele. Não havendo prova de tal autorização por parte da assembléia-geral, o Min. Relator entendeu correta a decisão do tribunal a quo ao extinguir o feito sem julgamento do mérito, por ausência de legitimidade ativa (art. 267, VI, do CPC). Diante disso, a Turma negou provimento ao recurso. REsp 882.782-RN, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 20/4/2010.

AÇÃO. PRESTAÇÃO. CONTAS.

A questão está em saber se a ação de cobrança desenvolvida pelo rito ordinário afigura-se como medida judicial adequada para que o mandante obtenha de seus mandatários, assim constituídos por escritura particular e por mandato verbal, a devolução de valores por eles recebidos para quitar obrigação dele perante terceiro (condomínio residencial), em decorrência de descumprimento do mandato. Inicialmente, esclareceu o Min. Relator que a relação jurídica estabelecida entre as partes consiste, incontroversamente, na prestação de serviços de gerência e administração de bens. A ação de cobrança desenvolvida pelo rito comum (sumário, nas hipóteses previstas em lei, ou ordinário, nos demais casos) tem por escopo constituir um título (judicial), o que tornará possível a cobrança de valor definido decorrente da relação jurídica de crédito e débito entabulada entre as partes, demonstrada por qualquer meio de prova admitido em direito (excetua-se de tal definição, é certo, a prova escrita constante do art. 1.102a do CPC). Já a ação de prestação de contas, que se desenvolve pelo procedimento especial constante nos arts. 914 a 919 do CPC, tem por finalidade principal justamente explicitar a destinação das receitas e despesas efetivadas pelo gestor na administração de bens, negócios ou interesses alheios, a qualquer título, para, após, definir a existência de eventual saldo e propiciar sua cobrança. Tem-se, portanto, que a ação de prestação de contas consubstancia a medida judicial adequada para aquele que, considerando possuir crédito decorrente da relação jurídica consistente na gestão de bens, negócios ou interesses alheios, a qualquer título, para sua efetivação, necessite, antes, demonstrar cabalmente a existência da referida relação de gestão de interesses alheios, bem como a existência de um saldo (a partir do detalhamento das receitas e despesas) vinculado diretamente à referida relação. In casu, ainda que se possa reconhecer a existência de gestão de bens alheios pelos réus em razão de outorga de mandatos (escrito e verbal), inexiste qualquer vinculação entre os valores transferidos a um dos réus (bem como a um terceiro estranho à lide) e os mandatos referidos, ilação que somente poderá ser reconhecida na ação própria, qual seja, a de prestação de contas. A hipótese não trata de erro de procedimento (rito que não corresponde à natureza da causa), caso em que o juiz poderia determinar sua conversão a um procedimento mais abrangente. Na verdade, o caso cuida de erronia sobre a própria ação, impropriedade que, de forma alguma, pode ser suprimida pelo magistrado, na medida em que esse erro denota a ausência de uma das condições da ação, qual seja, o interesse de agir, na modalidade adequação, ensejando, necessariamente, a extinção do feito sem julgamento do mérito. Diante disso, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso. REsp 1.065.257-RJ, Rel. Min. Massami Uyeda, julgado em 20/4/2010.

UNIÃO ESTÁVEL. CASAMENTO.

Cuida-se de ação de reconhecimento de união estável post mortem e consequente dissolução ajuizada pela recorrente em face dos herdeiros do de cujus. Na ação, ela alega ter mantido relacionamento pelo período de 30 anos, de 1970 até 2000, ou seja, até a data do falecimento do aludido companheiro. Salienta que dessa união advieram quatro filhos. Ressalta que trabalhou como sua secretária pessoal, relacionamento profissional que se transformou em afetivo, culminando com o nascimento dos filhos. Acrescenta que o companheiro separou-se judicialmente da primeira mulher em 1983, ano em que reconheceu a paternidade dos filhos. Por sua vez, os netos, na contestação, alegaram que o avô nunca viveu em união estável com a autora, e sim em concubinato impuro, visto que nunca se separou de fato da primeira mulher. Embora separados, conviviam como se fossem casados, dividindo o teto conjugal, que nunca se desfez. O Min. Relator (em voto vencido) dava provimento ao recurso, entendendo que a ausência de coabitação não constitui motivo suficiente para obstar o reconhecimento de união estável. A Min. Nancy Andrighi, em seu voto vista divergente, mas vencedor, destacou que a declarada ausência de comprovação da posse do estado de casados, vale dizer, na dicção do acórdão recorrido, a ausência de prova da intenção do falecido de com a recorrente constituir uma família, com aparência de casamento, está intimamente atrelada ao fato de que, muito embora separados judicialmente, houve a continuidade da união dele com a primeira mulher, pois permaneceram juntos até a morte do cônjuge varão, o que vem referendar a questão, também posta no acórdão impugnado, de que não houve dissolução do casamento válido, ponderando-se, até mesmo, a respeito do efetivo término da sociedade conjugal, porque notória a continuidade da relação, muito embora não formalizado pedido de retorno ao status de casados. Nos termos do art. 1.571, § 1º, do CC/2002, o casamento válido não se dissolve pela separação judicial, apenas pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio. Por isso mesmo, na hipótese de separação judicial, basta que os cônjuges formulem pedido para retornar ao status de casados. Já, quando divorciados, para retornarem ao status quo ante, deverão contrair novas núpcias. Esse entendimento, consagrado pela doutrina e jurisprudência, sob a vigência do CC/1916, apenas foi referendado pelo CC/2002, o que permite sua incidência na hipótese. Por fim, a Min. Nancy Andrighi entendeu que a relação mantida entre o de cujus e a recorrente era despida dos requisitos caracterizadores da união estável. Dessa forma, na hipótese de eventual interesse na partilha de bens, deverá a recorrente fazer prova, em processo diverso, de eventual esforço comum. Diante disso, a Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, negou provimento ao recurso.REsp 1.107.192-PR, Rel. originário Min. Massami Uyeda, Rel. para acórdão Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/4/2010.

Quarta Turma

CONDENAÇÃO. LITIGÂNCIA. MÁ-FÉ.

Aquele que causar dano com sua conduta processual responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18 do CPC). Porém, conforme o art. 16 do referido codex, somente as partes, assim entendidas como autor, réu ou interveniente, em sentido amplo, podem praticar o ato. Com efeito, todos que, de qualquer forma, participam do processo têm o dever de agir com lealdade e boa-fé (art. 14 do CPC). Apenas os litigantes estarão sujeitos à multa e à indenização a que se refere o art. 18 do CPC em caso de má-fé. Ademais, os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esse fim, não podendo o magistrado condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18 do referido código, nos próprios autos do processo em que for praticada a conduta de má-fé ou temerária. Precedentes citados: AgRg no Ag 1.106.019-SP, DJe 18/5/2009; AgRg no Ag 717.034-PB, DJ 15/10/2007, e REsp 140.578-SP, DJe 15/12/2008. REsp 1.173.848-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2010.

INDENIZAÇÃO. VÍCIOS. SERVIÇOS. PRESCRIÇÃO.

Cuida-se, na espécie, da ação indenizatória por danos morais e materiais na qual a autora, ora recorrente, alega que os serviços de reparo realizados pelas recorridas, seguradora e oficina, não foram feitos a contento. O tribunal a quo entendeu aplicável o prazo de 90 dias previsto no art. 26, II, do CDC para a reclamação por vício na prestação do serviço. Contudo, a Turma deu provimento ao recurso por entender que o prazo decadencial aludido no referido artigo é aplicável na hipótese de reclamação pelo defeito no serviço prestado, o que não ocorreu na espécie. O que se pretende é a indenização por danos materiais e morais decorrentes da má prestação do serviço, demanda de natureza condenatória, sequer sujeita a prazo decadencial, mas sim prescricional. Logo, aplica-se o art. 27 do CDC, que estipula prazo de cinco anos para a hipótese. Precedentes citados: REsp 742.447-AL, DJ 16/4/2007; REsp 782.433-MG, DJe 20/11/2008, e ArRg no Ag 771.737-MG, DJ 11/12/2006. REsp 683.809-RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2010.

GARANTIA. PATRIMÔNIO. S/A. SÓCIO.

O crédito penhorado em ação em que se litiga a respeito da sobrepartilha de bens de um dos acionistas da sociedade anônima pertence, exclusivamente, a ela; consequentemente, não pode servir de garantia ao pagamento de dívida do sócio acionista, uma vez que as responsabilidades e patrimônios não se confundem. RMS 19.149-GO, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2010.

NOTA PROMISSÓRIA. NULIDADE.

A nota promissória emitida com duas datas de vencimento distintas é nula, não se aplicando, por analogia, o art. 126 do CPC, uma vez que ela somente será aplicada quando houver lacuna na lei. No presente caso, há lei específica sobre o tema, qual seja, o art. 55, parágrafo único, do Dec. n. 2.044/1908, bem como o art. 77 c/c o 33 do Dec. n. 57.663/1966. REsp 751.878-MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 20/4/2010.

MS. CABIMENTO.

A impetração do mandado de segurança só é admissível quando, de plano, pode ser aferível o direito líquido e certo no ato de sua propositura, sem a necessidade de dilação probatória. Assim, a decisão judicial que, com base em certidão, conclui pela inexistência de prolação de sentença em processo falimentar não pode ser impugnada por meio daquele writ, porquanto não se reveste de teratologia ou flagrante ilegalidade. Precedentes citados: RMS 18.070-RJ, DJ 13/12/2004, e RMS 13.957-MG, DJ 24/3/2003. RMS 30.081-RJ, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/4/2010.

HERANÇA. MEAÇÃO. SEPARAÇÃO TOTAL. BENS.

A Turma entendeu que o espólio tem legitimidade para se contrapor ao pedido de habilitação do cônjuge supérstite; pois, conforme jurisprudência, antes da partilha, todo o patrimônio permanece em situação de indivisibilidade, a que a lei atribui natureza de bem imóvel (art. 79, II, do CC/1916). Esse condomínio, por expressa disposição de lei, em juízo, é representado pelo inventariante. Logo, não há falar que a universalidade consubstanciada no espólio, cuja representação é atribuída ao inventariante, seja parte ilegítima para a ação proposta pelo herdeiro. Outro tema abordado foi quanto à meação em razão da existência de pacto antenupcial que estabelece o regime de separação de bens entre a recorrente e o de cujus: a Turma reafirmou o entendimento de que há óbice ao direito de meação se o pacto antenupcial estabeleceu o regime de separação total de bens. Assim, o pacto antenupcial de separação impede que o cônjuge supérstite habilite-se na sucessão. Entendeu, ainda, que, apesar de o regime jurídico de separação de bens ser voluntariamente estabelecido e imutável, admite-se, excepcionalmente, a participação patrimonial de um cônjuge sobre bem de outro se demonstrada, de modo concreto, a aquisição patrimonial pelo esforço comum. No presente caso, o tribunal a quo afirmara haver participação da ora recorrente nas empresas do casal, mas deixou expresso que não há sequer um único documento que comprove a existência da sociedade de fato. Assim, afastou o direito à meação e remeteu às vias ordinárias a pretensão da recorrente quanto à sua condição de sócia. A Turma, então, quanto a esse tema, aplicou a Súm. n. 7-STJ, pois o afastamento, na instância especial, do art. 984 do CPC aplicado pelo tribunal a quo demandaria o revolvimento das provas. Precedentes citados: REsp 123.633-SP, DJe 30/3/2009; REsp 286.514-SP, DJ 22/10/2007; REsp 1.111.095-RJ, DJe 11/2/2010; REsp 992.749-MS, DJe 5/2/2010, e REsp 1.080.614-SP, DJe 21/9/2009. REsp 689.703-AM, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 20/4/2010.

RESOLUÇÃO. EXORBITÂNCIA. LEI.

A Resolução n. 4/2002 do Conselho Nacional de Residência Médica (CNRM), que veio complementar e explicitar o Dec. n. 80.281/1977 e a Lei n. 6.932/1981, em seu art. 38, estabelece a transferência dos médicos que estiverem cursando residência médica em instituição que venha a ser descredenciada do programa de residência médica, determinando a obrigação de continuidade do pagamento da bolsa até a conclusão do curso. Todavia, tanto o decreto como a lei não criaram para a instituição o encargo de remunerar quem não mais lhe presta serviços. Assim, a resolução extrapolou os limites de sua competência ao fazê-lo e, consequentemente, a decisão judicial lastreada naquela resolução é passível de ataque via mandado de segurança. RMS 26.889-DF, Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 20/4/2010.

PENHORA. ELEVADORES. HOTEL.

Trata-se da penhora de três elevadores de um imóvel no qual funciona um hotel. O tribunal a quo entendeu ser possível a penhora, pois no local há 13 elevadores, e a constrição incidente sobre três deles não inviabiliza a exploração da atividade comercial. A Turma deu provimento ao recurso, por entender que, além de os elevadores não serem considerados adornos para aformoseamento ou comodidade, encontram-se incorporados à estrutura do edifício, sendo insuscetível de divisão ou alienação. Ademais, ressaltou ainda que a penhora dos elevadores é inaceitável, pois levaria ao desligamento dos bens e à consequente inviabilidade da atividade fim do recorrente. Precedentes citados: REsp 259.994-SP, DJ 22/11/2004, e REsp 89.721-RJ, DJ 24/6/1996. REsp 786.292-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 20/4/2010.

Quinta Turma

SERVIDOR. TCE. TETO REMUNERATÓRIO.

Servidores inativos de tribunal de contas estadual (TCE) impetraram, na origem, mandado de segurança irresignados com a redução de seus proventos após a Lei estadual n. 13.464/2004, editada devido à nova sistemática de tetos remuneratórios máximos estabelecida na EC n. 41/2003. O fato de que a emenda constitucional deixou de definir, de maneira expressa, no art. 37, XI, da CF/1988, o teto remuneratório a ser adotado para os membros dos TCEs propiciou a referida legislação estadual, segundo a qual os vencimentos dos servidores daqueles tribunais não poderiam exceder o equivalente ao subsídio dos deputados estaduais. Neste Superior Tribunal, no recurso dos servidores inativos, enfrentou-se, preliminarmente, a prejudicial de decadência apontada pelo Parquet federal. Para o Min. Relator, não há a decadência apontada, pois a jurisprudência deste Superior Tribunal definiu que a redução de vencimentos sofrida por servidores denota prestação de trato sucessivo, em que o prazo decadencial renova-se mês a mês. Ressalta também o Min. Relator que a pretensão mandamental, no caso dos autos, requer uma análise quanto à vinculação dos tribunais de contas frente aos órgãos do Legislativo. Aponta que o STF, com base no art. 44 da CF/1988, reconheceu que o TCU atua paralelamente ao Congresso, mas sem compor o órgão. Por outro lado, também na esfera federal, a Lei n. 8.443/1992 (Lei Orgânica do TCU) e os arts. 73 e 96 da CF/1988 deixam clara a autonomia do TCU. Ainda na CF/1988, o § 3º do art. 73 prevê expressamente que os ministros do TCU têm as mesmas prerrogativas dos ministros do STJ e, no art. 75, determina que as normas estabelecidas para o TCU aplicam-se no nível estadual. Observa, assim, que, sem pretensão de afirmar que os tribunais de contas estariam submetidos a outro Poder, mas por uma questão de simetria e sob influxos de uma interpretação sistemática do texto constitucional, o Judiciário é o parâmetro mais apropriado para definir o teto remuneratório dos servidores dos TCEs. Conclui que, embora seja facultado aos estados federados, discricionariamente, por lei, fixar subteto remuneratório inferior ao limite máximo extraído da sistemática constitucional – como na hipótese dos autos, com a edição da Lei estadual n. 13.464/2004 –, com parâmetro no Judiciário, tais valores remuneratórios não podem superar o limite máximo correspondente ao vencimento dos desembargadores estaduais (até a proporção de 90,25% dos salários de ministros do STF). Note-se que, na espécie, os valores excedentes já vinham sendo pagos anteriormente à fixação do subteto instituído pela legislação estadual e a remuneração paga àqueles servidores enquadravam-se no máximo admitido pelas regras constitucionais. Também não se admite irredutibilidade de vencimentos (art. 37, XV, da CF/1988). Dessa forma, os valores excedentes serão transformados em vantagem pessoal nominalmente identificada (VPNI). Ante o exposto, a Turma deu provimento ao recurso dos servidores. Precedentes citados do STF: AgRg no RE 524.494-AL, DJe 24/4/2009; AgRg no RE 544.080-SP, DJe 1º/7/2009; MS 22.801-DF, DJe 14/3/2008; RE 560.067-SP, DJe 13/2/2009; do STJ: AgRg no Ag 870.902-PB, DJe 27/4/2009; AgRg no Ag 1.025.893-RJ, DJe 3/11/2008; REsp 861.939-ES, DJe 10/3/2008; RMS 3.804-RJ, DJ 30/10/2006; REsp 659.207-PB, DJ 21/11/2005; REsp 504.920-SE, DJ 13/10/2003; AgRg no REsp 1.121.598-ES, DJe 16/11/2009; AgRg no RMS 20.314-SC, 1º/2/2010, e AgRg no RMS 27.391-RJ, DJe 1º/3/2010. RMS 30.878-CE, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/4/2010.

PAD. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA.

O impetrante, juiz de direito, aposentou-se voluntariamente com proventos proporcionais, mas tinha pendente processo administrativo disciplinar (PAD) que apurava fatos imputados ao magistrado. Noticiam os autos que a aposentadoria voluntária foi concedida com a expressa consignação de não haver prejuízo quanto ao trâmite de processo administrativo em curso. Assim, concluído o PAD e comprovadas as condutas reprováveis praticadas quando ainda no exercício da magistratura, a pena aplicada foi a de substituição da aposentadoria voluntária pela aposentadoria compulsória (art. 42, V, da LC n. 35/1979). Diante desses fatos, a Min. Relatora afirma ser evidente que não houve violação dos princípios da legalidade e segurança jurídica quanto à pena aplicada. Com esse entendimento, a Turma, ao prosseguir o julgamento, denegou a ordem. RMS 18.448-PR, Rel. Min. Laurita Vaz, julgado em 20/4/2010.

CONFISSÃO ESPONTÂNEA. PREPONDERÂNCIA. REINCIDÊNCIA.

Trata-se de paciente condenado como incurso no art. 157, § 2º, I e II, do CP à pena de sete anos e cinco meses de reclusão em regime inicial fechado, além de ao pagamento de multa. Agora, no habeas corpus, busca a compensação entre a circunstância atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência. Para o Min. Relator, a ordem não merece ser concedida; pois, na doutrina e na jurisprudência deste Superior Tribunal, firmou-se o entendimento de que a circunstância agravante da reincidência, como preponderante, deve prevalecer sobre a atenuante da confissão espontânea a teor do art. 67 do CP. Com esse entendimento, a Turma denegou a ordem. Precedentes citados: HC 43.014-SP, DJ 29/6/2007; REsp 889.187-SC, DJ 19/3/2007; REsp 960.066-DF, DJe 14/4/2008; HC 81.954-PR, DJ 17/12/2007; REsp 912.053-MS, DJ 5/11/2007; HC 64.012-RJ, DJ 7/5/2007, e REsp 713.826-RS, DJ 20/6/2005. HC 152.085-DF, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/4/2010.

PRISÃO PREVENTIVA. CONDIÇÕES FAVORÁVEIS.

Para o Min. Relator, as condições pessoais favoráveis não têm o condão de, por si sós, garantir a revogação da prisão preventiva, se há nos autos elementos hábeis a recomendar a manutenção da custódia. Além disso, ao contrário do que afirma a impetração, no caso dos autos, a prisão preventiva está satisfatoriamente fundamentada na garantia da ordem pública, tendo em vista a periculosidade do paciente, evidenciada não só na gravidade do crime, mas também em razão do modus operandi de sua conduta criminosa que, tal como praticada, extrapola o convencional. Ressalta que, segundo consta dos autos, o paciente vem cometendo crimes sexuais contra menores e, entre elas, sua própria filha. Daí ter sido denunciado como incurso nas sanções do art. 214 c/c o 224, a; 213 c/c 224, a, e 226, II, por várias vezes, na forma do art. 71, todos do CP (antiga redação). Ademais, consta também dos autos que o paciente vem promovendo diversas ameaças contra os familiares das vítimas, o que é fundamento suficiente para manutenção da segregação cautelar, uma vez que há concreta possibilidade de ameaça contra a vítima e testemunhas. Diante do exposto, a Turma denegou a ordem. Precedentes citados: RHC 18.170-MG, DJ 21/11/2005; RHC 17.809-CE, DJ 14/11/2005; HC 42.061-DF, DJ 26/9/2005, e HC 44.752-GO, DJ 26/9/2005. HC 155.702-GO, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/4/2010.

CONVOCAÇÃO. TJ. JUÍZES.

Os pacientes foram condenados por infração aos arts. 155, § 4º, IV, c/c o 14, II, todos do CP e, no habeas corpus, buscam a nulidade do acórdão a quo por ofensa ao princípio do juiz natural, tendo em vista que o julgamento ocorreu em câmara criminal composta majoritariamente por juízes de primeiro grau. Sucede que a celeuma sobre o sistema de convocação de juízes, para atuação no TJ de São Paulo, foi resolvida no STF (Informativo do STF n. 581), no sentido da regularidade dessas convocações visto que tais convocações seriam uma resposta à difícil conjuntura de sobrecarga de trabalho para atender a efetividade a um novo direito fundamental introduzido na Constituição a partir da EC n. 45/2004. Assim, diante da posição adotada pelo STF, a Turma denegou a ordem por não haver a nulidade apontada. Precedente citado do STF: HC 96.821-SP, DJe 15/6/2009. HC 153.326-SP, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 20/4/2010.

Sexta Turma

CRIME. DIGNIDADE SEXUAL. MENOR. DEPOIMENTO ESCRITO.

In casu, conforme os autos, o paciente, aproveitando-se de estar a sós com a vítima (adolescente de 12 anos), da qual é tio, chamou-a ao banheiro onde realizava um conserto hidráulico; ali ele segurou a mão dela junto ao seu órgão genital, até esgotamento de sua lascívia. Após tal ato, determinou que não falasse nada a qualquer pessoa. Vale registrar que esse fato ocorreu na casa da adolescente, sendo que ela relatou o ocorrido à sua mãe, contrariando determinação do agressor. O juiz condenou o ora paciente à pena de seis anos e seis meses de reclusão em regime aberto pela prática do delito descrito no art. 214, c/c o art. 224, a, e art. 61, II,f, todos do CP; na apelação, a sentença foi mantida. Daí adveio o habeas corpus no qual se alegou que o conjunto probatório é insuficiente para sustentar a condenação. Acentuou-se que o magistrado fundamentou sua decisão apenas no testemunho da vítima menor de idade. Alegou-se, ainda, suposta violação do art. 204 do CPP, visto que o depoimento da ofendida não ocorreu de forma oral. A Turma entendeu, entre outras questões, que, mesmo não se realizando o depoimento oralmente, não houve ofensa do disposto no art. 204 do CPP. Isso porque a vítima lavrou a declaração em audiência diante do magistrado, do representante do MP e da advogada de defesa, não trazendo documento previamente escrito. Ressaltou-se que, não tendo a vítima coragem para narrar os fatos na sala de audiência, a ela se oportunizou a lavratura do texto, na presença das autoridades acima descritas, bem como na presença de sua mãe, que em nada interferiu. Assinalou-se que, em face da sua situação peculiar (menor que sofreu abusos sexuais), justificava-se a eleição de tal meio para tomar suas declarações. De toda sorte, a defesa também não se insurgiu contra a prova apresentada em audiência. Observou-se que o CPP acolheu o princípio pas de nullité sans grief, daí se conclui que somente há de se declarar a nulidade do feito quando resultar prejuízo devidamente demonstrado pela parte interessada e, na espécie, entendeu-se não haver qualquer prejuízo ou constrangimento ao exercício de defesa do acusado. Diante disso, denegou-se a ordem. Precedentes citados: HC 48.228-PB, DJe 20/10/2008, e HC 26.163-MS, DJ 11/4/2005. HC 148.215-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 20/4/2010.

RECURSO EXCLUSIVO. DEFESA. MAJORAÇÃO. PENA.

Trata-se de habeas corpus que se cingiu à verificação do acerto do acórdão recorrido que promoveu, em recurso exclusivo da defesa, correção de erro material, de cálculo, incrementando significativamente as penas dos pacientes. A Turma reconheceu procedente o reclamo da impetração, visto que o tribunal a quo corrigiu o erro de cálculo em que teria incorrido o magistrado de primeiro grau e, assim, em recurso exclusivo da defesa, majorou de modo significativo a sanção criminal imposta aos pacientes. Manifesta, pois, areformatio in pejus, visto que, por mais que erro houvesse, não seria por meio de recurso defensivo que o tribunal de origem poderia modificar a sentença, acarretando gravame tão intenso em desfavor dos pacientes. Com esse entendimento, concedeu-se a ordem. Precedentes citados: HC 92.088-RS, DJe 16/3/2009; HC 121.382-RJ, DJe 9/3/2009; HC 93.251-SP, DJe 1/9/2008, e HC 56.953-DF, DJ 9/4/2007. HC 80.133-SE, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 20/4/2010.

TRÁFICO. ENTORPECENTE. LEI N. 11.343/2006.

Trata-se de habeas corpus cujo objetivo era a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. Para tanto, sustentou-se que a norma entrou em vigor depois do julgamento, devendo retroagir para beneficiar o paciente. Nesta instância, ao se apreciar o writ, observou-se inicialmente ser certo que, na data da sentença, 9/8/2006, a lei mais benéfica (Lei n. 11.343/2006) ainda não estava em vigor. Contudo, a apelação da defesa foi julgada em 29/11/2007, quando já estava vigente o referido diploma legal. Assim, entendeu-se não se tratar de hipótese de entrada em vigor da lei após o trânsito em julgado, o que levaria à competência do juiz da execução para apreciar a matéria. Na verdade, a instância de origem deveria ter-se manifestado no julgamento da apelação acerca da aplicabilidade da mencionada causa de diminuição de pena. A omissão do aresto atacado configura manifesto constrangimento ilegal, que deve ser sanado de ofício, para que aquele tribunal enfrente a matéria. Todavia, sob pena de indevida supressão de instância, é inviável o conhecimento do habeas corpus para que se examine, desde logo, o mérito do pedido, visto que não se enfrentou o tema no acórdão impugnado. Diante disso, a Turma não conheceu do writ, mas, de ofício, concedeu a ordem para determinar que o tribunal a quo manifeste-se sobre a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006. Precedentes citados: HC 115.443-SP, DJe 8/3/2010, e HC 79.658-GO, DJe 1º/2/2010. HC 106.887-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 20/4/2010.

LEI MARIA DA PENHA. AMEAÇA. LESÃO CORPORAL.

In casu, o ora paciente foi preso em flagrante, sendo denunciado por, supostamente, ter ameaçado de morte, por duas vezes, e agredido fisicamente sua ex-companheira (arts. 129, § 9º, e 147 c/c 71, todos do CP). O juiz singular deferiu-lhe a liberdade provisória, entendendo ausentes os requisitos que autorizam a custódia preventiva, ressaltando mostrar-se suficiente a aplicação de medidas protetivas. O tribunal a quo, ao julgar o recurso em sentido estrito do MP, restabeleceu a prisão provisória do paciente, entendendo-a necessária em razão de sua periculosidade. Destacou que ele havia ameaçado a vítima anteriormente e vinha comportando-se de maneira inadequada, levando o filho de ambos à força, além de não comprovar trabalho lícito. Ressaltou a existência de registro anterior pelo cometimento de violência contra outra vítima. Nesta superior instância, contudo, entendeu-se que não se justifica a custódia cautelar do paciente, pois não se logrou demonstrar, de forma concreta, que sua liberdade ofereça risco à ordem pública. Salientou-se que, embora haja informação de que o paciente já havia proferido ameaças contra a ex-companheira, o próprio magistrado sentencianteentendeu desnecessária a prisão provisória, fixando medidas protetivas que se revelam suficientes para garantir a segurança da vítima. Destacou-se que o paciente já se encontra em liberdade há mais de um ano e não há notícia de que tenha descumprido tais determinações. Destarte, inexistindo descumprimento de medidas protetivas, a hipótese em questão não se enquadra naquelas que admitem a decretação de prisão preventiva, notadamente porque os delitos imputados ao paciente são punidos com pena de detenção. Assim, tratando-se de crimes punidos com tal pena, não sendo o paciente vadio e inexistindo dúvida sobre sua identidade, condenação anterior ou descumprimento de medidas protetivas, torna-se injustificável sua custódia cautelar. Diante disso, a Turma concedeu a ordem. Precedentes citados: HC 100.512-MT, DJe 23/6/2008, e HC 89.493-MG, DJ 26/11/2007. HC 151.174-MG, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 20/4/2010.

 
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